Em 2015, um grupo de super-humanos escapa de uma base do governo para salvar o mundo, e acaba descobrindo uma série de segredos sombrios. Essas são suas histórias.

Innuendo

Em 1947, na pequena cidade de Roswell, nos Estados Unidos da América, uma experiência envolvendo alguns dos maiores cientistas do mundo e um artefato de origens e propriedades desconhecidas desencadeou uma sucessão de eventos que, nas décadas seguintes, daria início a uma Guerra Fria de supersoldados e arquivilões que mudaria por completo e para sempre o destino do pequeno planeta Terra e de alguns de seus patéticos habitantes. Não para melhor, na maioria dos casos, e não de quaisquer de seus patéticos habitantes. Na verdade, apenas alguns poucos – predestinados, eleitos ou simplesmente condenados – de qualquer sorte de poder – humano ou superior – que o colocasse em condição de ver ligeiramente através das paredes de vidro negro. A presença de super-humanos nas principais agências governamentais de Inteligência do mundo cuidou , nos quase 70 anos que hoje nos separam da infeliz e audaz experiência de Roswell, para que tais eleitos tivessem seríssimas dificuldades em agir furtivamente na Terra de 2017. É claro que medidas como aquelas eram absolutamente necessárias, visto que mesmo assim não era possível conter por completo os movimentos desses predestinados. Alguns deles se infiltravam em organizações para-governamentais de iniciativas ocultas para buscar proteção. Outros, tentavam unir-se para somar possibilidades. Existiam, no entanto, alguns condenados que haviam entrado no jogo por acidente, e agora precisavam manter-se vivos. Eram em geral pessoas com poder demasiadamente insignificante para interessar a qualquer grupo de poder, e ao mesmo tempo perigosos e traiçoeiros demais para conseguirem aliados. A essas pessoas, os mais desgraçados de toda a Tragédia Roswelliana, restava cavar buracos até os mais profundos confins da Terra e, de lá, tentar mover suas peças em um tabuleiro de xadrez infinito onde cada peça – cada reles peão – é um jogador.

Grenko Mardov era um desses homens. No ano de 2017, seu grupo de extermínio conseguiu recrutar um jovem com habilidades sobre-humanas. Ninguém soube detalhes de como isso ocorreu, mas nos meses seguintes, o grupo de extermínio de Grenko Mardov decuplicou em contingente e influência. Havia entrado, em Agosto de 2017, na lista dos 50 mais procurados da Interpol, e sua lista de crimes superava até mesmo a de países em que era procurado. Sem poderes que o mantivessem a salvo de olhos e garras hostis, Mardov buscou segurança isolando-se no lugar mais obscuro e remoto que conseguiu encontrar na Terra.

Duchambe, 02h11min AM, GMT+5, hora local.
Tente imaginar becos escuros, de poucos metros de largura entre paredes de pedra irregular e madeira rota e úmida, chão de uma terra vermelha seca a ponto de agredir as narinas de alguém pouco habituado ao árido. Ao longo dessas ruas, homens, mulheres, velhos, crianças e animais partilham em total igualdade da glória do Grande Allah e da desconsolante miséria da menor e mais pobre nação da Ásia Menor. Dos seus pouco mais de sete milhões de habitantes, mais da metade vive em situação de insustentável e deplorável pobreza. Seus fiéis súditos de Allah, os Tadjiques, ainda se recuperavam de uma guerra civil que a menos de duas décadas devastara toda a pequena nação do Tadjiquistão. Seus habitantes, árabes, persas e russos ainda remanescentes, resquícios da Guerra Fria, viviam um governo de desmandos e corrupção que deixava poucas portas abertas ao progresso e muitas a interesses de homens como Grenko Mardov.

E foi em um daqueles becos, escuros e imundos, de odor transitando entre suor, excrementos e ópio, iluminado por uma ou outra rara lamparina a óleo e pelas estrelas de um céu limpo como a Terra jamais seria, que Claude Monet Nistelroy, trajando vestes locais pobres e intencionalmente surradas, olhou ao redor e perguntou-se como diabos encontraria aquele homem naquele inferno.

É bem verdade que qualquer homem, honesto ou bandido, cristão ou muçulmano, veria em tal paradigma um problema insolúvel. Claude não conhecia sequer o centro de Duchambe, a capital do Tadjiquistão, quanto menos sua periferia. As ruas eram incubadoras de assassinos, prostitutas, mercadores de ópio, vigaristas em geral e toda sorte de ladrões. Pelo menos com a última casta Claude estava bem habituado. Os adeptos da vida fácil de Duchambe não podiam, afinal, ser tão diferentes dos de qualquer outro lugar. Além disso, Claude não era qualquer homem, não era um bandido e tampouco um homem honesto e nunca fora cristão ou muçulmano.

Não falar sequer uma palavra do idioma local, uma variação moderna do persa chamada Tadji, também não era exatamente um problema para quem sabia se comunicar com o corpo. Um olhar ameaçador, uma mão que rouba Somonis do bolso de um Tadjique para estendê-los a outro, alguns eventuais e inevitáveis golpes, sempre tomando cuidado com velocidades excessivas, e a capacidade de pronunciar em voz baixa o nome de Grenko Mardov, foram suficientes para que antes do nascer do Sol o londrino com nome francês e sobrenome holandês chegasse ao pequeno sobrado de pedra com grades altas e grossas de ferro arcaicamente enferrujado.

Sabia que estava agindo precipitadamente, sabia que entrar em sigilo no Tadjiquistão, perguntar pelo nome de Mardov nos becos do submundo, roubar, espancar e ameaçar seus homens e bater à porta da frente do covil de um homem que foge de algumas das mais poderosas instituições do mundo, não era exatamente o que se chamaria de um plano prudente e bem arquitetado. Mas Claude sabia improvisar, sabia pensar rápido, e tinha consigo que somente isso poderia mantê-lo no controle da situação toda.

Com movimentos felinos e inauditos, ele se esgueirou escondeu, saltou por sobre grades e nocauteou dois guardas do portão sem emitir um único ruído. Pegou suas armas, os amarrou ao portão e, com a maior naturalidade que seu amadeirado semblante permitiu, acendeu um charuto, caminhando até a grande porta igualmente amadeirada da frente, batendo nela com três pesados golpes. Uma pequena janela de deslizar correu lateralmente, revelando um par de olhos azuis e um cano metálico que parecia de uma .45 norte-americana. O homem grunhiu algo interrogativo em idioma Tadji, que Claude incompreendeu por completo. Deu uma longa tragada no charuto. A fumaça esvaiu, revelando aos olhos azuis um Claude de cabelos grenhos e ensebados, sujo, malcheiroso e que não fazia barba a mais de uma semana. Tirou o charuto da boca e disse aos olhos e ao cano, no mais puro e legítimo inglês que conhecia.

“Diga ao senhor Mardov que ele tem uma adesão”

Um comentário:

Unknown disse...

Se esse conto não tiver continuação eu acho que vai ser bem triste... Se não pode nos adiantar o que diabos o Caulde ta fazendo nesse fim de mundo???