Em 2015, um grupo de super-humanos escapa de uma base do governo para salvar o mundo, e acaba descobrindo uma série de segredos sombrios. Essas são suas histórias.

Making Of: Alisia Kelly Bryant.

A Sunshine sempre foi, e de certa forma ainda é, para mim, um problema. Como tenho dois Making Of's para fazer, decidi começar por ela por dois motivos: foi minha primeira personagem aqui e é a mais difícil de explicar. O Claude é bem mais tranqüilo porque tem inspirações mais evidentes.

Bom, depois de jogar a saudosa (e agora iminente) campanha de Rurouni Kenshin com os caras, dando criação à modalidade PbS (play by skype), o Calliban me chamou para jogar uma campanha de Era do Apocalypse, para a qual eu pensei em criar um cara chinês controlador de sombras. Bom, acabou que a campanha não foi de Era do Apocalypse, meu personagem no fim não era chinês, não controlava sombras e nem era um cara.

Foi trabalhoso criar personagem. O Calliban é o sujeito mais mala do multiverso para aprovar personagem. Vetou uns 5 meus, alegando que eram alvos móveis, que não tinham estilo, que não iam funcionar em grupo, e por aí vai. Foi quando eu relia uma edição do Superboy e vi um heróizinho fuleiro da terceira divisão da Liga da Justiça, o Ray. Esse maluco tinha passado a infância sendo criado à noite porque diziam que ele tinha uma doença rara que o impedia do contato com luz solar. Ele aos 20 anos fez uma experiência com o irmão mais velho, depois que os pais já tinham morrido, e descobriu que na verdade ganhava super-poderes em contato com luz. A primeira coisa que pensei foi "puta dum mote legal prum PC, mas ta mal aproveitado". Tudo bem, não acho que a Alisia seja a melhor forma já empregada para o tema, mas convenhamos que ficou mais estilosa que o Ray. Mas o ponto não é esse.

Na primeira versão, a Alisia já usava o codinome Sunshine, mas seu poder era basicamente voar e disparar rajadas laser. Ela também tinha uma limitação extremamente chata: precisava de luz para ter poderes. Isso já complicou a vida dela mais de uma vez. Quando saíram os suplementos Power Corrupts 1 e 2 pela Devil's Workshop, surgiu o poder Photon Control. Foi aí que montei o combo de visão absoluta da moça. Esse poder, devo confessar, é o mais divertido de todos, nem a supervelocidade do Claude é tão legal. Bom, basicamente depois disso (e com a chegada da segunda edição do M&M) a ficha dela mudou pouco, ampliando os usos de luz e efeitos da supervisão. Ah, sim, ela perdeu a limitação de precisar de luz, agora ela pode inclusive emitir quantidades enormes de luz.

Mas a grande questão com a Alisia não é a ficha. A personalidade dessa moça sempre foi um problema. Primeiro porque só havia jogado com personagens femininas uma vez antes disso, em uma campanha de Dungeons & Dragons. Pensei em como montar uma personalidade feminina que convencesse. Lembrei da frase do Jack Nicholson no "Melhor Impossível" quando seu personagem escritor é perguntado sobre como conseguia criar personagens femininas tão convincentes. "I think about a man, and then take away the reason and accountability". Talvez seja verdade, mas com a Alisia não deu certo, ou pelo menos não me convenceu. Tentei moldar aos poucos sua personalidade, o que me fez começar a escrever os primeiros registros (hoje perdidos) dos Diários da Alisia, que o Call até curtia ler. Ajudou um pouco, mas com o passar dos anos aquela personalidade de menininha da Alisia não colava mais. A mulher já tinha visto o fim do mundo de perto meia dúzia de vezes, já tinha visto gente morrendo aos baldes, já tinha quase morrido outras tantas (lembrando a histórica ocasião em que o Voltage disparou a eletricidade de Manhattan inteira nela). Definitivamente a garota precisava de uma personalidade mais madura.

Comecei colocando ela de vez dentro da ONU, cuidando de incidentes diplomáticos envolvendo super-humanos. Também acabei com a história de loira burrinha, comprando mais Inteligência e perícias ligadas a geopolítica. Adicionei também um tom irônico e sarcástico no discurso dela. Achei por bem colocar mais um trauma na infância noturna dela, e transformei o tio bonzinho num bêbado solitário abandonado pela mulher e disposto a fazer coisas más com ela. Esse trauma fortíssimo fez com que a personalidade dela mudasse para algo afetivamente amargurado e sexualmente distante. A partir daí decidi explorar uma área até então latente nela: o aspecto inumano. O cenário (onde os personagens na prática não são exatamente humanos) favoreceu isso. Não se considerando humana, ela não se considera sujeita aos valores humanos. O que isso significa? Que ela tem um senso de moralidade e justiça próprio, que não necessariamente vai de encontro com o senso comum. Isso piora com o fato de que ela bebe. No princípio pensei em cocaína, mas achei clichê demais, até porque uma versão "What If..." do Claude já tinha feito isso antes. Achei que álcool seria mais romântico, mais decadente. Foi aí que meu lado sombrio deu vazão ao lado sombrio da Alisia. Comecei a imaginar que tipo de coisas um ser humano (e em seguida um ser inumano) faria se pudesse ver e não ser visto? Melhor, se pudesse matar a um quilômetro de distância? Claro, a Alisia não é uma assassina, mas isso não quer dizer que ela não mate quando acha necessário.

Com tanta coisa ruim, como ela trabalha com os heróis? Bom, primeiro ela considera os Next Steppers como iguais. Dentro dessa idéia, ela considera a Extreme (e mais alguns agregados) como amigos, e ela só tem amigos de verdade entre seus iguais. Sendo a luta de seus amigos, é sua luta também. Isso reflete insegurança e pouca auto-perspectiva (o que é interessante paralguém que vê tanto). Ela também luta porque mesmo não se sentindo humana, não se sente à vontade convivendo com o sofrimento humano. Difícil dizer se ela se julga racialmente superior a um ser humano, mas individualmente ela não consegue se imaginar superior a nada. O que deu verdadeiramente um novo sentido a sua vida sem dúvida foram os super-poderes. Ela os vê claramente como uma dádiva, e acredito que se sentiria muito mal se um dia fosse privada deles.

Realmente difícil fazer isso. Do jeito como está ela parece quase uma vilã. Não é o caso, ela ta mais para anti-heroína amargurada, meio como a Elektra porém mais light. Ou melhor, mais disfarçada, como ficará melhor demonstrado no próximo conto. O X da questão ao analisar a moça , acredito eu, acaba sendo: ela é uma pessoa boa, que deu alguns azares na vida (isso descreve bem toda a Extreme, aliás) mas que tem seus lados humanos, seus lados inumanos e que não tem muitos problemas para dormir a noite.

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