Em 2015, um grupo de super-humanos escapa de uma base do governo para salvar o mundo, e acaba descobrindo uma série de segredos sombrios. Essas são suas histórias.

O doce sabor da cereja.

Já está tarde, há seis horas estou trabalhando neste bracelete transdimensional que meus companheiros me trouxeram. A tecnologia dele é absurda, inimaginavelmente maior do que tudo o que eu já fiz. E tudo isso contido num bracelete. É claro que isto tinha de ser obra de Van Rayner, um dos famigerados first steppers. Quando penso nele, no nível das suas produções intelectuais, a disputa entre Ignus e eu se torna infantil. Pra que disputar o segundo lugar? E segundo lugar mesmo? Ou eu não contei os outros first steppers, como Hideo, Tcheckov, aquela chinesa com problemas que nem as teses doentes freudianas explicam? E eu ainda não citei a organização de cientistas que querem dominar o mundo, a Daydream, ou o ancestral Denorus. Neste mundo há tantos seres de poder e conhecimentos maior que os meus que as vezes me sinto como uma criança ouvindo o professor discursar sobre coisas além do meu pequeno universo imaginário. Quando penso no mundo em que vivo, percebo o quão quixotesca é a minha vida como Crusader.
"Os parâmetros da leitura do disco rígido foram estabelecidos, a descompactação do arquivo será iniciada em 4.6 segundos. Tempo previsto para o término da sessão: 35 horas." Avisa Ávalon.
Com essa previsão é melhor arranjar algo para fazer. Essa pesquisa me deixou cansado, meus reflexos estão mais lentos, preciso de uma xícara de café. Impressionante! Eu cruzo o corredor e encontro Nicholas me trazendo uma bem quente e reconfortante, ele me diz algo como ser sua receita secreta, mas eu nem presto atenção, estou completamente tomado pelo aroma do café. Eu bebo um pequeno gole e metade dos meus problemas desaparecem. A química sempre me intrigou nestes aspectos, a mistura de substâncias diferentes, elevadas a uma temperatura x e pronto, temos uma substância completamente nova. A reestruturação e a fusão das moléculas acontecem em momentos banais do dia a dia e quase nínguem repara nisso. Alguns cientistas ignoram as pequenas alterações, como se elas não fossem importantes perto de seus grandes projetos, mas eu não, eu sempre gostei dos detalhes, das pequenas coisas. É claro que nunca me aprofundei em química, sempre gostei mais de mecânica, de construir, de movimento, energia. Mas todos os pequenos detalhes, as pequenas parcelas da construção possuem suas fórmulas químicas.
O café é deveras reconfortante, por um curto espaço de tempo me disperso apenas saboreando o doce e forte líquido. Mas logo volto a conversar com Nicholas, estou preocupado com ele, parece que fazem dias que ele não dorme ou descansa, trancado neste laboratório procurando uma cura para Christine. "Você está precisando descansar meu amigo, sair um pouco, tomar um ar. Seu estado está lastimável. Se ficar assim sua produção cairá assim como sua saúde." Nicholas não responde, não com palavras. Eu me calo. Deve ser muito difícil para o coitado ver Miracle naquele estado, presa em um traje para conter seus poderes radioativos, ele tem razão de não estar com pacência para a minha alegria. Agradeço o café meio sem jeito. Ele sabe que eu me importo com ele e com Christine, que o considero um dos meus melhores amigos, se não o melhor. Porém eu não sou ele, preciso de sono, alegria, conforto. Além do que, não há muito o que eu possa fazer além do que estou fazendo. Tudo isso sobre geneativos é ainda muito novo para mim.
Me despeço de Nicholas e saio da repartição dos laboratórios. Ando até a sala de recreação e encontro Hisa lendo um dos seus romances, daqueles bem dramáticos e tristes. Ela é uma mulher muito bonita e atraente. Quando eu entro ela me olha nos olhos, como se quisesse sugar minha alma para dentro daqueles globos amendoados. A maioria dos homens ficaria envergonhada quando uma mulher o olhasse assim. Eu sou muito diferente da maioria dos homens. Retribuo o olhar, ela abaixa a cabeça e volta a ler. Sorrio e me aproximo do sofá. Sou interrompido pelo barulho regular de saltos altos.
Escuto a voz de Alísia atrás de mim comentando algo sobre as Nações Unidas, algo a ver com seu país de origem, o Canadá. Ela muda o assunto e me pergunta onde se encontra Ghünter, nosso aliado alemão. "Na Justa como sempre" eu respondo sem me virar. Não que Alísia não chame atenção, é uma mulher linda, loira , um corpo escultural. Além disso é inteligente e sabe cativar qualquer pessoa com um sorriso. Por isso mesmo eu me mantenho a distância dela, Alísia é muito parecida comigo em algumas questões e eu odeio isso em uma mulher. Quanto a Ghünter, às vezes eu me pergunto se ele tem realmente uma vida, ou se ele é só um autômato inventado por algum cientista doente. Já me perguntei se ele era gay, mas cheguei a conclusão que não, ele parece ser alheio ao fulgor de viver mesmo, tendo como único motivo impulsionador para continuar vivendo a luta, acho que se um dia tirarem isso dele, ou mesmo se não existir mais a violência do mundo, ele travaria, como um computador que não consegue ler uma nova linha de programa.
Para a sorte de Ghünter e de Miharu, uma versão feminina do alemão, mas sem o discurso religioso ou heróico, exite a Justa. A minha versão da "Sala do Perigo". Uma sala de alta tecnologia virtual, especialmente elaborada para a simulação do combate, ajudando assim no treinamento e na performance geral da Extreme.
Alisia parte em procura do alemão, me deixando a sós com Hisa. Ela se vira para mim e me encara inquisitiva. "Sabe Hisa, já faz um tempo que estou nesta base trabalhando sem parar e estava pensando se você não gostaria de sair pra jantar comigo esta noite." Falo com a voz suave em japonês, olhando nos olhos dela, ela fica envergonhada. Eu noto. "Eu sei que você também deve estar entediada aqui, nós poderíamos sair, aproveitar a noite, nos divertir. O que você acha?" Ela sorri e me responde em ISL que sim. Hisa é muda, vítima de alguma maldade da máfia japonesa que ela não merecia sofrer. A vida é por deveras cruel, mas nós podemos torná-la bem melhor se quisermos. Nós saímos da base em direção a minha casa. A viagem é rápida, em pouco tempo eu estou no meu quarto, penúltimo andar do prédio e Hisa no dela, dois andares abaixo do meu.
É gratificante ter um prédio todo ao meu dispor, eu nunca tenho problemas para alocar amigos. Hisa e Miharu estão morando aqui já faz 5 meses. Ghünter preferiu continuar no seu pequeno apartamento no Harlem, eu respeito isso, ele prefere se sentir independente e se isolar ao mesmo tempo. Eu prefiro o conforto e a qualidade de vida que eu levo. Entro no meu quarto, coloco Schubertz para tocar e entro na ducha. 23 minutos depois estou de roupão. Eu precisava dessa ducha, muito. Caminho lentamente até o mini bar e pego a garrafa de Scotch. Derramo o líquido vagarosamente no copo com 2 pedras de gelo. Paro quando chego na metade do copo, então pego uma soda gelada e completo o drink. Sempre fui bom fazendo drinks. Com o copo na mão caminho até o closet e escolho minha indumentária: Blazer e calças negros e minha camisa azul escura Hugo Boss de seda chinesa, digo minha pois pois fui eu quem criei o estilo junto com Giovanni Bucci no inverno passado em Milão. Ótima idéia comprar boa parte das ações da empresa. Coloco o roléx daytona que ganhei de Merrick no nosso aniversário de 12 anos e estou vestido.
Ainda tenho 5 minutos, me sento e sorvo demoradamente meu club soda enquanto ouço as partes finais da melodia de Schubertz. Quando termino o drink estou completamente relaxado; saio e logo estou na porta de Hisa. Como esperava ela está pronta, e maravilhosamente linda. Maquiagem leve no rosto, um batom com cor, cheiro e provavelmente gosto de cereja; o cabelo extremamente liso está preso em um coque oriental; o corpo esguio veste o vestido negro que comprei, enquanto à mostra o belo e exótico dragão em suas costas aparece pelo decote longo. Mas o que primeiro chega a mim não é a visão exuberante, mas o olor de cereja que se espalha ao seu redor. Eu quase fico boquiaberto, quase.
"Você está perfeita!" eu assevero em voz contente. Ela sorri timidamente em resposta. Nós seguimos até o elevador em passos calmos, no percurso eu aproveito para elogiar os detalhes de sua beleza, as mulheres adoram isso. Durante a descida o perfume dela inebria minha mente, mas eu não comento sobre isso até chegarmos na garagem de carros clássicos onde escolho a chave do Cadillac 1959 azul.
O carro, é claro que não está como o original. Eu refiz todo o motor, começando pelo combustível utilizado para movê-lo. Ao invés do enorme tanque de gasolina há uma câmara ultra tecnológica que funciona a base de células de energia, sim, eu usei os carros como protótipos experimentais para a energia base da armadura de Crusader. A câmara do carro, contudo é enorme se comparado ao bastonete da armadura. Quanto ao motor, digamos que os 4,3 de potência do carro original foram superados pelos meu reajustes e a célula de energia faz o carro andar sem eu me preocupar com o gasto de combustível fóssil ou a destruição do planeta.
Abro a porta para Hisa entrar, ela adora. O motor não ronca como o original, achei muito exagerado, mas faz barulho suficiente para que não percebam a diferença do original. Hisa parece adorar o carro, foi por isso que escolhi exatamente esse dentre tantos.
Chegamos ao restaurante que escolhi, Masa, localizado em Midwest town ele fica um pouco longe do bairro onde moramos (Upper East Side), o que nos faz aproveitar ainda mais o passeio no Cadillac e aumenta o apetite, fora que o Masa é um restaurante 5 estrelas há mais de 10 anos. Embora não tenha feito reservas, uma breve conversa com o gerente nos garante a melhor mesa da casa.
Pedimos sashimi, Hisa se delicia com o Atum azul. Apesar de apreciar o gosto nipônico, ainda prefiro o salmão. Entre o sashimi e o sushi conversamos; Hisa é uma mulher intrigante e muito tradicional. Ela é muito diferente de Tessa, o que é muito interessante. Hisa tem um passado misterioso, mas depreendo algo como uma dívida dos seus pais para com a Yakuza. Por causa dessa dívida tornaram ela muda, acho que fizeram algo com as cordas vocais dela, mas também pode ser psicológica a mudez. Ela tem uma boca bonita, pequena e meiga. Ainda penso se o batom tem mesmo gosto de cereja.
Bebo um pouco do sakê, me tranquilizo com o líquido forte. O Masa é um lugar muito bom, vim com Tessa aqui umas duas vezes. Tessa, tão longe, em Londres, trabalhando, sozinha. Será que ela pensa em mim? Será que está mesmo sozinha? Nunca se sabe, por isso eu não me preocupo, pelo menos estou muito bem acompanhado. Ela pede para que eu fale um pouco de mim, eu pergunto o que ela quer saber. "Tudo", me diz com o movimento das mãos.
Eu falo. Sobre meu pai, que hoje penso ser meu pai adotivo, o Coronel Maddock. Sobre meu irmão e a morte que resultou no meu senso de heroísmo. Falo sobre o responsável por isso, Herman Von Gostrauken, o famigerado e detestável Nightmare. Falo sobre minha Fundação, os projetos que tenho em mente. Mas não falo nada sobre Tessa, ela não precisa saber.
Comemos muito bem, a conta de 1000 dólares me diz isso. Estou um pouco alto, mas em condições de dirigir.
Agradeço o chefe em japonês, a comida estava estupenda. Nos levantamos e quando saímos, todos na casa nos notam, mas eu estou acostumado com isso. Ao chegar perto do carro, um homem nos aborda. 32 anos, 1,86 de altura, 93 kilos, caucasiano, provavelmente do Brooklyn. Ele tem uma Smith & Welson nova nas mãos, arma bonita para um ladrão barato, é claro que é roubada de alguém que resistiu a um assalto. Ele me aponta a arma na cabeça e diz que vai me matar se eu não entregar o dinheiro. Ele acha que me assusta, não faz idéia do que eu já enfrentei. De quantas vezes estive perto da morte. " Passa toda a grana riquinho de merda! Antes que eu te encha de pipoco!!!" O mais nojento é que uma saliva dele voa para meu Blazer.
Infelizmente para o assaltante eu não tenho tempo nem de responder. Hisa pula por trás de mim e atinge o infeliz com o bico do seu salto na testa. Deve doer muito. O que eu mais aprecio nestes sapatos caros femininos, é que elas podem chutar, pular, fazer graça. E eles não quebram. Ela olha para mim, parada ao lado do corpo estirado no chão, linda. Caminho até o assaltante e tiro a arma de suas mãos, é uma arma bonita e bem balanceada. Deixo um cartão no bolso dele sobre a fundação Warden, as cadeias estão lotadas e talvez eu possa lhe dar trabalho.
Abro a porta para ela, coloco a arma no porta luvas e então seguimos para casa. Depois de estacionar o carro, paramos um pouco no salão de recepção do primeiro andar. Coloco uma música lenta e trago Hisa para perto de mim. Ela não esperava por isso, mas se entrega ao movimento. Sorrio intimamente. "Vamos dançar um pouco, a noite está tão linda que eu não quero que termine.¨, sussurro no ouvido dela e ela encosta a cabeça no meu ombro.
Dançamos, os corpos colados um no outro, o aroma do perfume dela tão próximo. Tudo corre naturalmente, eu abaixo meu rosto, ela levanta o dela e me encara. Linda, tão linda e tão pequena, frágil nos meus braços, ela me olha. Não digo nada, não é preciso, ela já é minha.
Nossos lábios se tocam e eu descubro que os dela tinham mesmo o gosto de cereja, delicioso. O beijo demora, minhas mãos acariciam suas costas e a apertam para mais junto de mim, as dela me abraçam. Nos olhamos e nos beijamos de novo, o beijo de Hisa é diferente do de Tessa, Tessa tem mais paixão, mais romance, mas Hisa sabe usar muito bem a boca. A pego no colo e a levo para o elevador, não paramos de nos beijar no caminho. Hisa me surpreende dominando a situação, ela sabe muito bem o que faz e faz muito bem o que sabe. Ao mesmo tempo frágil e selvagem, exótica, linda.
Quando acordo no dia seguinte com o telefonema de Nicholas, não me pergunto se o que fiz foi certo ou errado, ou frases do tipo "o que foi que eu fiz". Eu sei o que eu fiz, afinal eu planejei. E foi muito bom, foi muito bom provar o doce sabor da cereja.
Me levanto e tomo um banho. Quando estou pronto para sair ela ainda está dormindo. Dou-lhe um beijo e saio. No caminho para a base ligo para Tessa. "Bom dia querida, como você está?", "Bem meu amor, estou com saudades" ela responde. "Eu também paixão, arrumando um tempinho livre eu vou para ae está bem?", "Que bom Rick, sinto sua falta, Londres não é nada sem você!" ela me diz com voz tristonha. "Eu também Tess, eu nunca esqueço de você."

3 comentários:

Guilhotina Voadora disse...

pensei seriamente se descrevia TODO o acontecimento, mas achei que ia ficar muito erótico, e crianças podem vir a ler o site.

Calliban disse...

"Criança", no singular.

Ahahaha o Richard é um Patife, cafajeste, malandro, mequetrefe, safado, de marca maior ainda!
Mas curti muito o conto ^^
Principalmente da cara de pau que o Richard ganhou nele!

Guilhotina Voadora disse...

EU estava tentando deixar o Richard mais humano, tirar dele aquela coisa de Reed Richards idiota e moldar mais um Tony Ultimates. Ser canalha ajuda muito a personagem.